RS celebra 4 anos de certificação internacional de zona livre de aftosa sem vacinação
Série de 3 reportagens vai contar a história do combate à febre aftosa, o papel do SVO e das entidades do setor
Publicação:

“A partir da década de 1980 desenvolvemos um programa, que depois se espalhou pelo Brasil, em conjunto com os países da Bacia do Prata, de identificação das áreas de risco, principalmente nas áreas de fronteira. E com o controle de trânsito, melhoria dos diagnósticos de laboratório e maior atuação da vigilância sanitária, nós fomos caminhando para uma coisa maior, para uma certificação de área livre de aftosa com vacinação”, lembra Marilisa Costa Petri, médica veterinária aposentada da Seapi.
A vacina foi o grande diferencial nestes primeiros tempos. A primeira versão desenvolvida era aquosa, produzida em coelhos, e utilizava como adjuvante o hidróxido de alumínio, que não conferia proteção duradoura e exigia revacinação a cada 4 meses. “Minha vida sempre esteve ligada ao controle de vacina. O Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) tinha uma fazenda em Sarandi, depois em Não-Me-Toque, onde se faziam os testes nos animais de 15 em 15 dias, para ver se a vacina era aprovada”, conta o fiscal federal agropecuário, José Alberto Ravison. Estes testes deram ao Brasil condições de ter uma vacina de excelência.
Mas foi em 1989 que surgiu a vacina oleosa, desenvolvida de forma pioneira no Rio Grande do Sul, pelo Instituto de Pesquisas Veterinárias Desidério Finamor (IPVDF), da Seapi. “Eu participei do registro da vacina oleosa junto ao Mapa, o Instituto foi o primeiro laboratório do Brasil a produzir a vacina contra a febre aftosa. O diferencial é que ela é aplicada uma vez ao ano”, declara Sylvio Alfredo Petzhold, médico veterinário aposentado do IPVDF. Ele lembra que foram produzidas 13,7 milhões doses da vacina oleosa. “Foi um tiro mortal na doença, porque dava uma imunidade mais duradoura, o que permitiu conter e depois erradicar a febre aftosa”. E Petzhold, emocionado, afirma. “Tenho orgulho de ter contribuído um pouquinho para a pujança do nosso estado, como gaúcho que sou”.

Para Luiz Alberto Pitta Pinheiro, assessor técnico da Farsul, esta mudança da vacina aquosa para a oleosa, foi um marco na luta contra a febre aftosa. “Podemos dizer que a luta contra aftosa pode ser dividida entre o antes e depois da vacina oleosa. Nós adotamos esta vacina de maneira pioneira e os resultados foram fundamentais para a quebra da difusão da enfermidade e da presença do vírus”.
Em 1998, o governo gaúcho retirou a vacinação e encaminhou o pedido de status sanitário de zona livre de aftosa com vacinação, junto com Santa Catarina. Mas em agosto de 2000, o município de Jóia registrou focos da doença sorotipo “O”, entre 23/08 e 22/09/2000. A decisão, de acordo com os protocolos vigentes, foi de sacrifício dos animais em um raio de 3 km. 11 mil animais foram sacrificados, entre bovinos, ovinos, caprinos e suínos.

“Uma das questões mais complicadas foi comunicar o fato aos produtores, do sacrifício dos animais, isso nos deixou com lágrimas nos olhos”, rememora Hélio Pinto, auditor fiscal federal aposentado do Mapa. Segundo ele, as forças federais e estaduais de defesa animal se juntaram e foram para o front, porque se tinha uma confiança no trabalho que estava sendo feito. “Nós seguimos todas as regras e normas preconizadas pela OIE e logramos êxito”, declara. Ele diz que o sucesso depende de alguns fatores, como o número de profissionais, o treinamento constante da equipe, uma frota de veículos compatível e recursos adequados.
Em 2001, novo foco, do sorotipo “A”, nos municípios de Santana do Livramento, Dom Pedrito, Rio Grande, Alegrete, Quaraí e Jari. Walter Leo Verbist, 38 anos de atuação como médico veterinário no Departamento de Produção Animal da Seapi, lembra desta ocasião. “A metodologia que utilizamos em 2001, de isolamento das propriedades, abate apenas dos animais com sintomas a partir dos resultados dos testes sorológicos se mostrou muito eficaz, a técnica foi muito bem empregada”, afirma.
Em 2020, o Rio Grande do Sul registrou a última etapa de vacinação contra febre aftosa e teve o reconhecimento de zona livre de aftosa sem vacinação. E em 27/05/2021, a Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) concedeu a certificação internacional de zona livre sem vacinação.
José Fernando Pereira Dora, médico veterinário da Seapi, que começou trabalhando como vacinador de febre aftosa, depois como veterinário em São Francisco de Assis, coordenador do Programa de Febre Aftosa da Seapi, depois do Centro Pan Americano de Febre Aftosa, afirma ter um orgulho muito grande da participação do Rio Grande do Sul na eliminação da febre aftosa no Brasil. “Nós começamos esta atividade lá atrás, no IPVDF, com pesquisa, diagnóstico e desenvolvimento de vacinas”, lembra. E hoje, o que se deseja, “é que se mantenha o alerta contra a febre aftosa, com a participação de toda a cadeia produtiva: dos produtores, transportadores de animais, frigoríficos, casas de produtos veterinários, vigilância sanitária, todos. Nós precisamos estar sempre de prontidão”, afirma.
A médica veterinária e coordenadora do Programa de Vigilância para Febre Aftosa da Seapi, Gazziane Rigon, afirma que o maior desafio é o de manter o produtor engajado quanto à necessidade da prevenção e da rápida notificação, em caso de animais com sintomas compatíveis. “Como estamos há muito tempo longe da doença, as pessoas tendem a relaxar com os cuidados, pois não se sentem em perigo. Porém o risco nunca foi e nem será zero, enquanto a doença existir no mundo. Com a questão da globalização, o trânsito de pessoas entre os países é rotineiro, bem como as trocas comerciais, o que pode facilitar a disseminação de agentes, por isso devemos estar sempre vigilantes”, alerta Grazziane.
Veja aqui uma linha do tempo da História da Aftosa no RS: Linha do tempo Febre Aftosa no RS
E confira nas próximas reportagens:
- 26/05 - o papel e as ações do Serviço Veterinário Oficial, com Darlene Silveira;
- 27/05 - o que pensam as entidades do setor sobre a conquista desta certificação internacional de zona livre de aftosa sem vacinação, com Fabrízio Fernández.